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Rosa & Romances

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Atalaia 4 - [capitulo 9]

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Na primeira semana de Agosto as pinturas na casa ficaram concluídas. Maria Madalena respirou então de alívio. Durante algum tempo iria ficar livre da pressão quotidiana do grupo de mulheres encarregues de zelar pelos domínios nubentes.

Receosa de que os seus desvios, por mau caminho, viessem a ser constatados, a rapariga andava cautelosa e agradável. Prestava-se a descrições pormenorizadas exigidas pelo namorado, concordava com as exigências da mãe e estava determinada a deslocar-se a Évora em companhia da madrinha para escolher o modelo do vestido de noiva.

Entregue ao inevitável, a rapariga, deixava o tempo correr ao sabor dos ditames agendados e desejava, para sossego do seu espírito, que tudo se encaixasse na ordem estabelecida. Retomou assim, a amizade de Magda que andava um pouco apagada, visitando-a até na sua própria casa, o que levou a amiga e D. Angélica a ficarem particularmente agradadas por essa reaproximação, prontificando-se para ajudar no que fosse preciso. Já D. Olívia continuava na defensiva e mesmo sob os protestos da irmã, continuava a não confiar nos bons resultados do contrato estabelecido.

O que mais estarrecia Lena era a possibilidade de Sérgio aparecer na Aldeia! Descontrolado como lhe parecera, poderia colocar em causa a sua segurança, reivindicando a sua atenção e entrega. Desesperava quando recordava as suas palavras “Conheço tudo sobre a tua vida - sei onde moras, quem são os teus pais e já apreciei a tua nova mansão.”, Sinal de que já teria andado por aquelas bandas. Sabe Deus quando? As coisas complicavam-se e Lena sabia que tinha de rematar todas as pontas que a sua leviandade andava a deixar soltas. Mas como? Era a derradeira pergunta. Pois bem, agora que o ano académico estava concluído só voltaria a Évora para renovar a matrícula e comunicaria ao pai a sua vontade de cancelar o contrato de aluguer da casa, evitando assim continuar perto de Mónica e com Miguel tão acessível. Évora passaria de residência permanente a local de visitas fortuitas. Também, logo que o casamento se concretizasse, as exigências da sua nova vida iriam ditar-lhe uma luta renhida para manter os estudos, certa de que estudos e desposar Paulo seriam perfeitamente incompatíveis.

No Domingo de manhã acompanhou a mãe à missa, no intuito de estabelecer o primeiro contacto com o padre. D. Olívia também se acercou, com a identificação do filho, para se informar do necessário.

Quando abandonou a igreja em companhia da mãe e da irmã Vera, alguém a esperava no largo! A figura querida de Mónica foi uma bênção para os seus olhos! A rapariga correu para si com um sorriso largo e aberto apertando-a nos braços.

-Lenita...vives no fim do mundo. O que eu penei para cá chegar!

Lena não se esquivou ao abraço da amiga, embora ainda sentisse em si um certo sentimento de mágoa. No entanto apresentou a amiga à mãe que, na sua secura, não se entusiasmou e só Vera atenuou a frieza, rejubilando com a nova amizade.

Seguiram para casa, acompanhadas pelo olhar contrariado de Magda que sentia a presença de intrusos no terreno que julgava seu!

Depois de comunicar à mãe que Mónica ficaria para almoçar, encaminhou a amiga para o interior do quarto e a muito custo dissuadiu Vera de as acompanhar.

-Não precisas de perguntar nada. Eu mesma me justificarei. -Foram as palavras de Mónica quando ficou frente a frente com Lena.

A rapariga consentiu e sentou-se na cama indicando a Mónica que tomasse lugar junto de si.

-Os irmãos estão com alguns problemas...

-Quais? - Quis Lena saber com o coração sobressaltado por julgar Miguel em perigo.

A amiga no entanto, solicitou-lhe sossego, para poder continuar:

-Quando foram a minha casa, naquele dia, necessitavam de alguns conselhos que só a sabedoria misteriosa de minha avó lhes poderia dar.

-Porquê? - Quis Lena saber, sem paciência para esperar as palavras escolhidas e calmas com que Mónica se justificava.

-Minha avó tem um Dom. Não me perguntes qual, são lá coisas dela. Gabriel sofre de qualquer distúrbio do espírito. Também não sei qual mas ele fica fora de si e nesses momentos altera-se completamente e só Miguel consegue acalmá-lo. Nesse dia, quando abandonas-te a minha casa, seguimos as indicações da minha avó e todos juntos rezámos para afastar o mal de Gabriel!

-Mas a tua avó não estava em casa.

-Estava sim tu é que não a viste.

-Já agora...-e Lena queria tirar a limpo outras situações. -o que fazia a minha fotografia pendurada num Santo no quarto da tua avó?

Mónica ficou perturbada e desviou o olhar da amiga.

-É como te digo. A minha avó tem um Dom. Sabe proteger as pessoas contra certos males.

-Mas que males é que eu posso ter. Isso é só treta. - Lena levantou-se impaciente. -Digo-te não gostei. Detestei até...fez-me lembrar quando se vai à bruxa para enredar a vida desta ou daquela como a minha mãe acredita acontecer. Eu sou como o meu pai não acredito em crendices...!

-Ok, Ok, vamos com calma. Não é nada disso. Eu falei á minha avó na tua situação, no teu problema com o casamento e ela disse “Faz-se uma protecção, tens uma fotografia” e foi assim. Nada demais!

-E depois veio o Rafael em segredo, colocar-me ao pescoço este cordão. - E mostrou-o à amiga.

-Eles estão desesperados. Acreditam que algo de sobrenatural os rodeia! Têm tido vários contratempos: a doença do pai, as dificuldades do negócio, os problemas de Gabriel, enfim um rol de contratempos que os torna vulneráveis e sensíveis.

-Pois eu acho que há ali muitas atitudes estranhas e gostava de apanhar Rafael sozinho sem a presença dos outros dois. -Maria Madalena convencia-se dessa necessidade, andando às voltas pelo seu próprio quarto, enquanto Mónica se mantinha sentada sobre a cama, sem alterações visíveis.

-Acredita, à volta destes três, há demasiados mistérios e enigmas. E o mais aberrante é que eu pareço fazer parte deles!

-Claro que não. - Afiançou Mónica – não serás tu a ver coisas onde elas não existem?

-Não...acredita que não. Vê bem... o mesmo Santo do altar da tua avó está na medalha de Rafael. Eu arranco a fotografia e logo a seguir ganho um cordão.

-Deixa-o estar. Não te prejudica. Nem a foto no oratório da minha avó. Nunca a devias ter retirado.

-Já te disse...não gosto dessas merdas. Se eu fosse ligar a tudo o que me vem acontecendo estava tramada. - Aqui esboçou um sorriso de troça - um filme de terror, digo-te eu!

Mónica voltou a incomodar-se.

-Devias rever a tua vida. Pelo que percebi já marcas-te o casamento na igreja?

-É verdade. Fui lá hoje falar com o padre. Coisas que têm que ser feitas. -resignou-se.

-É aqui que estás muito enganada.

Maria Madalena enfadou-se.

-Tu já estás como o Miguel. A verdade é que eu tenho que cortar mesmo com o passado. Mas com o passado recente. Esse é que eu já não controlo.

-E o Professor Sérgio?

Lena ficou estática, apanhada de surpresa.

-Outro problema na minha vida. Como vês são vários. Ao contrário dos irmãos os meus não são nada sobrenaturais, são do domínio natural, verdadeiramente desencadeados pela natureza humana.

-Maria Madalena não penses que sabes tudo. Às vezes és demasiado racionalista.

-E tu demasiado moralista.

Houve alguns momentos de tensão e foi Mónica quem os relevou, brincando um pouco:

-Mas qual é a verdadeira razão desta minha visita? Menina adivinhe?

Maria Madalena não encontrava outras razões que não fosse a necessidade da amiga se justificar por isso encolheu os ombros, denotando desinteresse.

Mónica procurou a bolsa, retirando dela um documento. Depois estendeu a folha de papel a Lena.

-Reserva num aparthotel! Férias no Algarve. - Lena gritou de entusiasmo. -Quem vai? Quem vai?

-Todos.

-Todos quem? O Miguel vai?

-Vai sim, ele garantiu. Eu, tu, o Miguel, o Pedro Dias, a Sara e a Adília. Tudo confirmado. -Mónica agora em pé perguntava. -Então estás contente?

-Fantástico.

Maria Madalena já relevava para segundo plano os compromissos que ainda há pouco tinha dado como certos e sentia-se, mais uma vez, no direito de gozar alguns momentos de descontracção. Aproveitaria a presença de Mónica para arquitectar um plano junto de sua mãe. O melhor era ela nem sonhar com a presença de rapazes!

 

Acertados os pormenores das férias, assentou-se perante Maria Manuela que a visita de Mónica era um convite expresso para Lena passar com ela, uma quinzena na praia em casa própria que a família possuía no Algarve. A mãe ainda se mostrou contrariada, certa das decisões erradas que a filha teimava em tomar. Joaquim, no entanto, deitou água na fervura e achou por bem que a filha desfrutasse de alguns momentos de lazer. As despesas do evento preocupavam a rapariga e nem a isso seu pai se mostrou alheio, quando em segredo se aproximou da filha, depositando-lhe nas mãos, considerável quantia. “Foi de um trabalhinho aos Domingos!”, sussurrou-lhe enquanto lhe pedia silêncio e descrição.

Restava a Maria Madalena levar Mónica até Portel onde esta encontraria transporte de regresso a Portalegre, evitando que a amiga voltasse a fazer despesa com o aluguer de um táxi. Assim iniciaram viagem, ao final da tarde ocupando-se Lena de guiar Mónica pelos espaços envolventes depois de lhe ter mostrado, com orgulho, os melhores recantos da sua terra. Não teve, no entanto, coragem de a levar à casa prometida, nem Mónica se mostrou interessada em conhecê-la!

Avançavam pela estrada em marcha regular, animadas por conversa casual que praticamente se cingia a pormenores do trajecto ou a situações banais ligadas a vivências comuns. Falavam alto e riam enquanto o veículo galgava o caminho sem sobressaltos. Uma lomba, uma descida acentuada e um troço de recta interrompido. Mónica leu em voz alta e o seu riso sonoro e aberto estancou, de repente, ensombrado:

-ATALAIA – 4...

Maria Madalena habituada ao espaço, não ficou surpresa com as palavras mas sentiu uma curiosidade estranha provocada pela mudança de humor repentina de Mónica. Avagou a velocidade e lançou sobre a amiga o desafio.

-Queres conhecer este lugar?

-E tu...conheces? - Perguntou Mónica, enquanto se apercebia que Lena não a deixaria decidir, pois de imediato guinou o volante virando à esquerda e entrando na estreita estrada da Atalaia. Só aí parou.

-Conheço. É um lugar antigo e solitário. Praticamente em ruínas, no entanto, transmite-me uma paz invulgar. Preenche-me, ajuda-me a reflectir e a questionar-me.

Mónica olhava em frente, ainda temerosa, enquanto voltava a questionar a amiga:

-Paz? Não te iludas. - Depois fez uma pequena pausa. Colocou a cabeça pela janela aberta e olhou em frente, para a estrada estreita que se desenrolava. Inspirou fundo e arrepiou-se. Quase num sussurro, exclamou: -Este lugar exala vibrações maléficas!

Agora foi a vez de Maria Madalena rir em sinal de troça.

-E quem as lança. Ninguém vive por estes lugares. -e mentalmente procurou assegurar-se das suas certezas, embora situações inexplicáveis a fizessem sobressaltar.

Mónica pareceu aperceber-se do seu ligeiro sobressalto porque a questionou com azedume:

-E atalaia não te parece um aviso...

-Um aviso? Porquê...que eu saiba o lugar e o nome existem há séculos.

-Sim...mas a placa, aquela...e olhou para trás. É um aviso. Devias saber lê-lo.

-Eu...? E diz-me o quê? A mim e a muitas outras pessoas que por aqui transitam. -Maria Madalena estranhava a atitude de Mónica e estava já decidida a retomar a marcha em direcção a Portel.

A amiga, no entanto, voltou-se para ela e segurou-a pelos ombros enquanto a fixava insistentemente:

-Para o geral das pessoas não passará de uma placa de informação quero, no entanto, que te concentres em ti, na tua própria vida. Que te diz “atalaia 4”? - Maria Madalena encolheu os ombros e Mónica continuou com o mesmo entusiasmo, acentuando e vincando as palavras:

-Que te ponhas à espreita, de sobreaviso, de vigia...não, não, espera...que te observam a ti...secretamente, não, não, deixa-me concentrar...-Mónica comprimia agora a zona frontal, fechando e apertando com força os olhos, procurando encontrar a verdadeira resposta no fundo da sua mente.

-Sim...”estar de atalaia” contra quatro. É esse o aviso, o sinal. Percebes?

Não, não percebia. E Mónica estava transfigurada, passara de pessoa normal a alguém mentalmente perturbado.

-Que dizes Mónica, estás a enlouquecer. Vamos voltar ao trajecto inicial, levo-te a Portel e vê se te recompões.

-Não...espera. Ainda tenho tempo. Continua, quero conhecer a Atalaia.

-Mónica que pensas tu que é a Atalaia. Não passa de um lugar perdido nas entranhas deste Alentejo.

-Quero ir! - Mónica esbugalhou os olhos, decidida a fazer Maria Madalena entender.

O automóvel avançou até metade do trajecto e Mónica continuava impaciente.

-Ainda falta muito?

-Mais ou menos dois quilómetros. Sabes “quatro” quer dizer 4 km! - Lena afiançou contrariada, enquanto olhava Mónica de soslaio.

A amiga não respondeu, mantendo o olhar colado na estrada estreita que se desenrolava, expectante do que surgiria.

-Aqui...-Gritou e Maria Madalena descontrolou-se de tal forma que o carro ameaçou resvalar pela barreira abaixo.

-Pára. Quero sair...- e Mónica saltou do carro com este ainda em andamento.

Lena começava a ficar seriamente preocupada, quase desconhecia a amiga, cada atitude era mais estranha que a outra. Estancou o automóvel e ficou lá dentro a olhar a rapariga esgazeada que xeretava na berma do caminho qualquer coisa desconhecida. Catava entre o pasto seco, desviando os juncos e de lá apanhou objecto ou elemento que se apressou a guardar dentro da bolsa de pano que trazia traçada.

Entrou e sentou-se.

-Que estiveste a fazer? -Perguntou Maria Madalena com os olhos postos na bolsa de ganga com missangas incrustadas.

-Coisas minhas. Vamos avança. - Ordenou-lhe Mónica secamente.

-Mónica vê se atinas, estás completamente descontrolada. Se a estrada não fosse tão estreita e me permitisse inverter a marcha mesmo agora voltava para trás.

-Nem penses nisso...-Mónica desesperou. -Agora mais do que nunca, preciso de pisar o solo daquele lugar.

-Que estupidez...-resmungou Lena, entre dentes, desagradada.

Ficaram em silêncio e o carro avançou estrada fora só parando na Atalaia.

Mónica não esperou por Lena, apeou-se e perdeu-se no emaranhado das construções. Maria Madalena ainda pensou em segui-la mas depois decidiu ficar encostada ao carro, espraiando a vista pela paisagem límpida que se desenrolava a sudoeste. Os seus olhos bateram então na construção situada à esquerda da estrada, ligeiramente oculta pela ondulação do terreno. Um monte rural de consideráveis proporções, cuja implantação deixava as traseiras viradas para a estrada em vez, de como era comum, lançar a fachada.

Lembrou-se que só daquele lugar poderia ter surgido a figura masculina a reclamar o cão.

É verdade. Nada mais soube sobre eles. Homem e animal. Será que os encontraria se os procurasse ali? Outro dia, porque hoje o tempo já escasseava para cumprir o horário do transporte. Resolveu então procurar por Mónica. Onde se demorava aquela maluca? Rodeou o monte, meteu pelo corredor, passando à horta e a escassos metros do portão do cemitério. Contornou a igreja e ficou de frente para ela. Nem sombras de Mónica. Só a porta principal, ligeiramente entreaberta, acusava ruído estranho, próprio de passos interiores.

-Mónica...- gritou. -Estás aí dentro. Tem cuidado que isto está perigoso.

Nem resposta. Apenas um murmurar abafado e incompreensível. Maria Madalena aguardou, determinada em manter-se em solo profano sem ousar devassar o espaço sagrado. No entanto era a sensação de ficar aprisionada no útero daquele lugar que lhe causava arrepios! Mónica, ao que parece, tinha facilidade em mover-se lá dentro e não parecia disposta a sair.

Com passos lentos e pequenos a rapariga aproximou-se da porta entreaberta, apoiou-se no portal, introduziu a cabeça e espreitou lá para dentro! Não viu, de início, fosse o que fosse. Habituado à claridade do dia o seu olhar retraiu-se e apertou-se, enquanto tentava vislumbrar na escuridão do interior a figura desaparecida. Cheirou-lhe a guardado, a espaço fechado, mofento, asqueroso até. O calor libertava e acentuava os odores. Ao fundo da nave, no que parecia ter sido a capela-mor, uma figura ajoelhada, frente ao altar principal, tecia um ritual de orações. O primeiro impulso de Maria Madalena foi entrar e arrastar a amiga para fora daquele espaço perdido. Depois conteve-se e contemplou a rapariga que entregue aos seus propósitos se mostrava praticamente alheada do que a envolvia. Respirou fundo e esperou. Alguns minutos se passaram e Mónica levantou-se, deu alguns passos em frente, abriu a boca, como quem recebe a hóstia sagrada, disse “amén” e regressou de cabeça baixa até ao fundo da nave. Aí parou, voltou-se, flectiu a perna direita e fez o sinal da cruz. Maria Madalena afastou-se do portal para deixar Mónica sair. Quando o sol vivo do entardecer lhe bateu no rosto a figura de Mónica parecia de cera. Fixou a amiga sem se alterar, baixou a vista e deitou-lhe aos pés um punhado de terra que trazia fechado na mão esquerda!

-Lamento... nada mais posso fazer por ti!

Lena pela primeira vez sentiu-se abalada. Porque se mostrava Mónica tão fora de si. Abraçou-a.

-Mónica querida...tu não estás bem. Vamos embora já daqui e quase que a arrastou até ao carro, sem que esta recuperasse.

Retomaram a viagem, descendo a estrada em linha recta, enquanto Mónica permanecia muda e estática com os olhos cerrados, recostada no assento ao lado de Lena.

Em determinada altura agitou-se e em desespero gritou:

-Pisaste e encontraste...Oh! Que falta de sorte. Depois deitou as mãos ao rosto e começou a soluçar.

Maria Madalena preferiu ignorar. Estava determinada a chamar Mónica à razão logo que abandonasse o atalho da Atalaia. Sentia, contudo, uma ligeira contrariedade porque também ela começava agora a dar maior importância a determinadas situações e a equacionar para elas, outras impossíveis, explicações!

 

O resto da viagem decorreu surda e muda. Mónica ia-se recompondo a pouco e pouco e Maria Madalena averiguava, de vez em quando, pelo torcer do olhar o modo de estar da amiga e sentia-se mais agradada pelo facto de esta aparentar já uma certa normalidade. Entraram em Portel e avançaram para o terminal rodoviário. Os desvios que fizeram pelo caminho, resultaram numa perda de tempo que motivou a chegada em horário apertado. Como o autocarro para Évora já estava na pista, Lena incitou Mónica a apressar-se para comprar o bilhete e esta entrou no edifício em passo de corrida, enquanto a amiga a aguardava cá fora.

Quando Mónica voltou com o bilhete, as duas raparigas só tiveram tempo de se abraçarem. O motorista apressava a entrada dos passageiros enquanto o motor ligado anunciava a rápida partida do autocarro.

-Até breve. – Sussurrou Mónica.

-Vamos sobe…boa viagem. – E Maria Madalena ficou a agitar a mão, enquanto Mónica ocupava lugar junto à janela, para lhe acenar também.

O autocarro arrancou e inverteu a marcha, tomando a direcção da saída. Mónica ficou do lado contrário. Lena quieta e pensativa respirou fundo enquanto sentia um leve roçar de pele macia pela sua mão…

-Menina… -Ao som do chamamento suave Lena virou-se e viu uma menina de tez branca, olhos azuis e cabelos louros, parecendo um anjo.

-A sua amiga deixou cair isto…da bolsa, quando tirou a carteira.

Lena lançou o olhar e estendeu a mão.